Devo ter escrito mais de uma dezena de textos sobre Rogério Ceni, desde que o conheci, como reserva de Zetti, cobrindo o São Paulo, em meados dos anos 90. Sou quase obrigado a voltar ao tema agora. As declarações de Ney Franco sobre ele, embora bombásticas e escancarando de forma cristalina a crise sem precedentes no São Paulo, não me surpreendem - e vou tentar explicar aqui os motivos nas próximas linhas.
Em primeiro lugar, as qualidades de Rogério Ceni... Um goleiro, sem igual. Nunca haverá outro como ele. Bom goleiro. Além disso, fez mais de 100 gols e mais de 1000 jogos por um mesmo time. Por isso mesmo incomparável.
Fora de campo, incomparável também. Nível intelectual acima da média, profundo conhecedor de tática e estratégia no futebol. Também vaidoso, um tanto quanto ciumento e péssimo perdedor. Não aceita derrota e não sabe reagir bem a ela. Assim, tornou-se alvo fácil e preferido de qualquer torcedor que não seja são-paulino e também da mídia.
Pois bem. Rogério, em tese, tem mais quatro meses de carreira...Vai se aposentar aos 40 anos, depois desta trajetória sem igual.
E esta trajetória está em risco. Seu clube pode cair para a segunda divisão e começam a pipocar opiniões desabonadoras sobre o seu comportamento - vide a entrevista de Ney Franco.
Ney não mentiu. Carregou um pouco nas tintas, ferido pelos últimos acontecimentos, mas não mentiu.
Rogério Ceni, talvez involuntariamente e pelo tempo de casa, faz parte da panela que governa o vestiário do São Paulo por décadas. Ele, o eterno auxiliar técnico Milton Cruz e companheiros da comissão fixa do São Paulo - um diferencial no passado, um problema no presente.
Para alguém de fora triunfar com essa panela é complicado... Técnicos de futebol, de quaisquer perfis, sofrem (Adilson, Ney Franco, Leão e outros tantos que o digam). Jogadores do tamanho ou 'maiores' que Ceni (com mais lastro internacional, como Lúcio e Luís Fabiano) e 'promessas das categorias' de base (como Casemiro) também.
A panela do CT - agora fortalecida, pela saída do dirigente Adalberto Baptista, pelo afastamento de Lúcio, pela presença de Paulo Autuori - governa e convive muito bem com treinadores com 'afinidades ideológicas' e jogadores experientes, mas subservientes também.
Juvenal Juvêncio, presidente do clube, que meteu os pés pelas mãos e se perdeu, tentou dissolver a panela (sob o escudo de Adalberto Batista) e encaminhar a aposentadoria de Ceni. Perdeu. Percebeu que, às vésperas de nova eleição, poderia ver seu time na série B.
E devolveu plenos poderes a Ceni e cia. Agora, o goleiro e capitão, com os escudeiros Autuori e Milton Cruz, herdam a missão de um final de ano digno para o clube e digno também para o maior jogador do São Paulo em todos os tempos. E só.
Se o legado de Ney Franco para Rogério Ceni e seus companheiros é "zero, zero e zero", eles têm de se preocupar em não deixar legado pior para quem vier em 2014.
Quando pendurar as chuteiras, Rogério Ceni pode se tornar treinador ou dirigente do São Paulo. Capacidade ele tem. Mas só será um técnico ou um dirigente bom se tiver aprendido lições de ambiente nos seus tempos de atleta.
Será que ele consegue?