terça-feira, 4 de junho de 2013

Dúvidas em abundância

Os gregos antigos entendiam de um monte de coisa e eram espetaculares em Filosofia. Adoravam jogar conversa fora nas praças, séculos antes de inventaram botecos, e punham a cabeça para funcionar. Diziam, por exemplo, que o caminho para a sabedoria se baseia mais na dúvida do que na certeza, pois uma estimula a busca da verdade, enquanto a outra leva à acomodação do ser humano. Batutas.
Acho que só mesmo com essa regressão a um período rico de ideias para engatar arrazoado que não pareça uma cornetada gratuita na seleção. Sem ser azedo, e longe de querer o mal desses rapazes e Felipão, depois do empate suado com a Inglaterra a gente fica com uma ninhada de pulgas atrás da orelha. O time que se exibiu ontem no Maracanã leva a algumas convicções e a muitas interrogações.
A maior das incertezas talvez se concentre no meio-campo, setor querido e crucial para nove e meio dentre dez técnicos. Não é tão diferente com Felipão, mesmo com os elogios que fez à formação inicial, aquela do primeiro tempo. Ou seja, começou com Luiz Gustavo e Paulinho na marcação, mais Oscar, Neymar e Hulk um pouco à frente. Terminou com Fernando e Hernanes se revezando na proteção à defesa, além de Bernard e Lucas ao lado de Neymar. Ou seja, mudaram os nomes, porém muito pouco a distribuição em campo.
Em ambas as opções, houve oscilações que se refletiram no ataque e na defesa. No primeiro tempo, com o fôlego em ordem, o Brasil foi pra cima, arriscou chutes (a maioria com Neymar), obrigou Hart a boas defesas. Ganhou no domínio de bola. Os ingleses se trancaram e, ao se soltarem, quase no final, testaram Julio Cesar. A seleção passou a impressão de superioridade, mas com poucos lances bem elaborados. Foi o que contou no jogo e o que chamou também a atenção de Felipão.
Na segunda parte, o ritmo caiu, houve o festival de substituições e sobressaíram pontos frágeis, como a falha na ocupação de espaços no meio, a falta de cobertura eficiente na descida dos laterais, e... de novo a ausência de jogadas trabalhadas. Como em outras ocasiões, com o próprio Felipão, com Mano ou Dunga, se apostou na capacidade individual, no poder de improviso dos jogadores, no lance que desata nós.
Apoio a criatividade, e ela nos diferenciou na história. Viva a liberdade de iniciativa. Mas ela funciona melhor com conjunto, com clareza do que cada jogador deva fazer. E isso ainda não se conseguiu. Coloco o "ainda" como pitada de esperança. Só que volta a dúvida: esta geração obterá até 2014 maturidade suficiente para assumir responsabilidade e decidir, como aconteceu 11 anos atrás? Rivaldo, Ronaldo e Ronaldinho desequilibraram no penta porque tinham autoconfiança que os moços de agora não possuem. Também não acho que se devam queimar etapas e temo por excesso de peso sobre eles.
Neymar novamente navegou no meio termo. Bem no período inicial, sumido no segundo. Soa bobagem, mas outro indício de que fechará nele o ônus de reger o time foi o fato de entrar com a 10 e não com a 11 de que tanto gosta. E 10, sabemos, é camisa do craque, é Pelé. Vamos com calma.
Pois então, o que fará Felipão daqui em diante? Vai fechar o meio? Apostará na velocidade do contra-ataque? Fica mesmo com os que iniciaram o jogo, como disse na entrevista? Poderá, em determinado momento, adiantar David Luiz (como fez com Edmilson em 2002) e colocar Dante na zaga? São questões que ficam no ar, para acompanhar nos treinos da semana, no teste com a França e na Copa das Confederações. E que as dúvidas levem à luz.
Para não ficar só na reticência, uma constatação: Fred está com lugar garantido até a Copa. Na hora do sufoco, tem feito gols significativos, como o de ontem. E Felipão leva isso em consideração. O atacante do Flu tem passaporte carimbadíssimo.
Pra terminar: o Maracanã está bonito, só que igual a todos os estádios modernos, modelo único. E já começou o clima de "Pra frente, Brasil!" Pode prestar atenção: está no ar...