terça-feira, 9 de outubro de 2012

Futebol e política


O futebol é apenas uma fração do significado de Barcelona x Real Madrid. Como em qualquer rivalidade germinada nos gramados, o placar pode ter seu valor futebolístico expropriado da realidade a ponto de justificar a materialização de uma vantagem, seja qual ela for.
De Boca Juniors x River Plate a Internacional x Grêmio, ninguém escapa, pois seu clube, com defeitos e virtudes, representa você. Mesmo que sejam apenas defeitos. O jogo é fruto das escolhas e dos riscos.
José Mourinho tem razão quando enxerga sua equipe mais próxima do rendimento do Barça. Com a defesa dizimada, o time catalão, agora dirigido por Tito Vilanova, ofereceu algumas oportunidades para o rival diminuir a diferença que os separa no campeonato.
Sorte do Barcelona, mais conservador sob o comando de Tito. O futebol idealizado por Pep Guardiola apresentava uma construção mais complexa: posse de bola, passe, movimentação, infiltração e finalização.
Quando o adversário interrompe esse fluxo, entra no jogo. E assim o Madrid produziu suas chances, oferecendo a posse e interferindo no resto. O empate foi justo e o resultado pequeno diante do uso político do embate.
O confronto Madrid-Barcelona - as cidades e seus clubes de futebol - estabelece valores esportivos e ideológicos que se misturam aos resultados do campo. Poucos clássicos foram tão aguardados do ponto de vista político como o de ontem. A crise econômica espanhola voltou a aquecer o nacionalismo catalão e a luta pela independência. "Sem um pacto fiscal, o caminho está aberto", garante Artur Más, líder do governo Catalão, atrás de pelo menos 5 bilhões para tapar as rupturas de seu caixa.
Com todo esse peso nas costas, jogadores de Barcelona e Real Madrid tentaram se desvincular da responsabilidade de salvar, dentro de campo, a unidade do país. A bandeira catalã, formada por um gigantesco mosaico de 98 mil torcedores, foi a lembrança dos compromissos assumidos antes do pontapé inicial diante de uma audiência global estimada em 400 milhões de pessoas.
Sandro Rosell, o atual presidente, diferentemente de Joan Laporta, seu antecessor, não tem o menor interesse de incrementar as aplicações políticas do clássico, mas teve de agir contra a vontade sob o risco de ter sua paixão ‘culé’ questionada.
E lá se foi mais um jogo, o clássico 222, capaz de reunir os melhores jogadores de futebol do mundo e ainda tocar a cena política espanhola entre gols e bolas divididas. Eles jamais vão se entender, até porque não se trata de festa no convento, é rivalidade em estado sólido.
A ironia das diferenças entre as maiores marcas do futebol mundial é o Madrid ter sido fundado por um catalão, Carlos Padrós Rubió, também presidente do clube entre 1904 e 1908. Essa parte da história, entretanto, os merengues não gostam de contar. Entende-se, é melhor ver Messi e Cristiano Ronaldo jogando.