terça-feira, 9 de outubro de 2012

Em Barcelona, política usa o futebol para "vender" a discutível ideia separatista

Muito se falou sobre o uso do futebol pelos políticos nos últimos dias. Não só pelos vários candidatos nas eleições municipais de alguma forma ligados ao esporte, como ex-jogadores, dirigentes, etc. O patético cancelamento da peleja entre Argentina e Brasil também escancarou o aproveitamento do futebol pelos políticos no país vizinho — leia a respeito clicando aqui.

Mas não é só por essas bandas que a modalidade mais popular do planeta é utilizada pela política. No superclássico entre Barcelona e Real Madrid assistimos a mais uma demonstração de como gente da Catalunha recorre aos jogos entre os dois rivais para "vender" a ideia de que separar da Espanha é um bom negócio para o povo catalão. Será mesmo?

Matéria de Erica Chaves, publicada no dia 30 de setembro no portal Terra, coloca alguns aspectos muito interessantes em discussão — clique aqui e leia na íntegra. Ela ouviu especialistas sobre as consequências de uma eventual separação da Catalunha, ou seja, o que aconteceria se a região ao sul da França se transformasse em um novo país, como sonha boa parte da população de lá.

Primeiramente, destaca a reportagem, seria preciso um plebiscito no qual toda a Espanha votaria. Isso já torna a ideia quase inviável. Mas digamos que fosse aceita. O país Catalunha nasceria fora da União Europeia e para ingressar no bloco teria que obter a aprovação de todos as nações que a formam. Entre elas a Espanha, naturalmente.

Montagem de toda uma estrutura para o novo país, criação de forças armadas e condições para cuidar de suas fronteiras e outras medidas teriam que ser tomadas de imediato. A matéria destaca que dos "150 bilhões de euros exportados pela região, 120 se destinam à Espanha e à União Européia". Dá 80%. Ou seja, novos acordos comerciais precisariam ser fechados rapidamente.

Mikel Buesa, professor de economia aplicada da Universidade Complutense de Madri, foi um dos economistas ouvidos por Érica Chaves. Ele frisa que devido às necessárias negociações, "o PIB catalão poderia cair até 25%, igualando aos de Grécia, Macedônia e Chipre". E acrescenta que todos os países que se separaram, como Tchecoslováquia, Iugoslávia e os que saíram da União Soviética registraram empobrecimento da população.

A jornalista ouviu lado catalão. Pesquisadora do Centro de Análise Econômica e Políticas Sociais da Universidade de Barcelona, Elisenda Paluzie Hernandez disse que com a separação, a autonomia catalã daria maior liberdade para crescer: "Como um Estado do tamanho da Áustria e o PIB per capita da Dinamarca, seremos mais abertos". 

Claro que a Espanha não quer perder uma de suas mais ricas regiões, embora a tenha socorrido há poucas semanas. Isso mesmo, recentemente os catalães pediram ajuda a Madri para pagar as suas contas — clique aqui e leia mais a respeito. A dívida da região autônoma é de 42 bilhões de euros!

Defensor da ideia, em entrevista ao Estadão — clique aqui e leia — o cientista político e filósofo Josep Ramoneda disse que a nova nação "de 7,5 milhões de habitantes, com uma base econômica forte, não teria dificuldade de se situar na média de desenvolvimento dos demais países europeus".

Em seguida ele admitiu que "a eventual independência também geraria outras questões, como assumir uma parte da dívida espanhola, do sistema de previdência, etc." Sobre como a Catalunha enfrentaria a crise, Ramoneda destaca que há uma certeza de que o novo país se sairia bem. Contudo, ressalta que tal avaliação "é feita muito mais do ponto de vista ideológico do que da análise econômica". 

No campo esportivo, o que seria do Barcelona ao sair da Liga espanhola? Jogaria contra quem? Participaria de um campeonato nacional tão ou mais risível do que o da Escócia, onde também se fala com frequência em separação (do Reino Unido) há vários meses. O isolamento afetaria o Barça não só no futebol como em outras modalidades, como o basquete. Imaginem o faturamento do clube a cada duelo com o Real Madrid. Ele deixaria de existir.

O tema é complexo e muito polêmico e mostra como a rivalidade com Madri não se limita ao futebol. Ele é apenas o meio pela qual a manifestam. Mas a separação da Catalunha, que parece tão bonita no grande mosaico do Camp Nou, na realidade, na prática, é bem discutível. Fico imaginando se aqueles que clamam pela independência, nas ruas e no estádio, têm a exata noção do que será de suas vidas se ela um dia acontecer. Estariam mesmo dispostos a alguns "sacrifícios"?  

É algo normal quando a política usa o futebol. Poucos pensam em todos os envolvimentos de uma questão como essa. É assim aqui no Brasil, na Catalunha e em qualquer lugar do mundo.


Mosaico dos catalães no Camp Nou antes do clássico entre Barcelona e Real Madrid
Mosaico dos catalães no Camp Nou antes do clássico entre Barcelona e Real Madrid