segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Sonhos e devaneios

No calendário do futebol brasileiro, este exato momento pode ser classificado como o do fim dos devaneios e do começo dos sonhos. Eu explico. Até agora, sem campeonatos a disputar, cartolas e empresários se ocuparam de ventilar a maior quantidade e os mais grandiosos nomes como possíveis reforços para os clubes de todo o País. Não importa se o jogador está preso contratualmente a um rico clube europeu, se a torcida não o quer, se ele está aposentado, se o salário que ganha é maior do que toda a folha do clube... O que importa é plantar o boato, agitar o mercado e fazer bater mais forte o coração iludido do torcedor. É a fase dos devaneios.

Encerrada essa etapa, com o ano esportivo começando para valer e as janelas de transferências se fechando, outra se inicia. A da realidade? Não exatamente. Na verdade, justamente o oposto. Em um dos comerciais de TV da célebre campanha Celebrando a Humanidade, do Comitê Olímpico Internacional, o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, aparece dizendo que o momento que ele mais gosta nos Jogos Olímpicos não é o das comemorações das vitórias nem o das premiações no pódio. Para ele, o momento mágico é o da largada das provas, onde todos os competidores, independentemente da riqueza e do poder de suas nações, estão exatamente na mesma condição. É uma imagem poética, ainda que saibamos que ela será abatida pelo tiro de largada e pelos primeiros passos ou braçadas dos atletas rumo à linha de chegada. Mas os torcedores gostam de poesia e, no início de toda temporada, não é difícil ouvir deles declarações como "este ano ninguém nos segura", "rumo a Tóquio" e "te cuida, Barcelona".
Sonhar faz parte, não custa nada e, como diria Machado de Assis, é melhor cair das nuvens do que do segundo andar. Que o torcedor tenha esse comportamento, ainda vá lá. O que não faz sentido é quando os dirigentes - e muitos deles agem exatamente assim - assumem ares de torcedor e, mesmo diante da realidade cinza de seus clubes, nutrem os mais coloridos sonhos de grandeza. Infelizmente para eles, depois de meia dúzia de rodadas, mesmo o mais otimista dos torcedores é confrontado com os fatos e sofre o duro choque da realidade. E a realidade é que raros são os times em condições de brigar de verdade pelos principais títulos em jogo no ano.
Em certas situações, a fase do sonho até se estende um pouco mais. Isso porque os campeonatos estaduais, que abrem a temporada, não são o melhor parâmetro para medir as chances dos clubes nas competições nacionais e internacionais. Cansei de ver times que deram a volta olímpica no estadual brigando desesperadamente contra o rebaixamento no final da temporada. Mas, como eu disse, o torcedor tem todo o direito de sonhar - e nessa sua capacidade de acreditar sempre reside grande parte da magia do futebol.
Já que falei em sonho, é com muita alegria que informo que hoje faço a minha estreia no time de comentaristas do SporTV, canal que é a grande referência das transmissões esportivas no país. É sem dúvida a realização de um antigo sonho - e espero que os amigos leitores embarquem nele comigo.