O veterano Biguá pisou o gramado vestido como jogador do Flamengo pela última vez. Não alinharia para a vitória sobre o Botafogo, no ensolarado dia de São Sebastião do Rio de Janeiro no ano da graça de 1954. Estava ali para dar continuidade a uma das mais caras tradições flamengas. Ao se despedir dos dias de luta para subir ao panteão reservado aos puros de alma, Biguá entregaria suas velhas chuteiras a um garoto do time juvenil. Franzino, Luís Carlos da Silva Nunes tomou os calçados de couro curtido em suas mãos e, lado a lado com Biguá, deu uma volta ao redor do gramado, ouvindo o aplauso do Maracanã lotado. E aceitou missão que lhe foi confiada.
No dia em que Carlinhos recebeu as chuteiras de Biguá, distante dali, no subúrbio de Quintino, na casa de número 7 da Rua Lucinda Barbosa, um bebê era embalado por sua mãe, Dona Matilde. Dezessete anos depois, o pequeno Arthur, Arthurzico, estaria no Maracanã para receber as chuteiras de Carlinhos. Basta conhecer um pouco da nossa história para saber que a essência rubro-negra original estava ainda intocada em Valido, e muito de Valido estava em Biguá, e que Biguá passou a Carlinhos, e Carlinhos a Zico, e Zico a todos nós. Oremos: eis a alma rubro-negra em toda a sua imensidão.
Esqueçam os números, a estatística, a exatidão dos dados. É do Evangelho Segundo Carlinhos: o Flamengo só perde para ele mesmo.
Contemplai, irmãos rubro-negros, nestas poucas palavras, a imensidão de nossa alma.
Obrigado, Violino.