sexta-feira, 19 de abril de 2013

Pódio no Mundial aos 15, gaúcha projeta Olimpíada e pede investimento na esgrima


Gabriela Cecchini fez 15 anos em 12 de abril de 2012. No lugar da festa de debutante, pediu para a família organizar um jantar para os amigos. Na época, a avó materna queria dar um vestido de gala à neta. A estudante, porém, pediu para dona Maria usar o dinheiropara lhe presentear com sua primeira roupa profissional de esgrima.
Grêmio Náutico União/Divulgação
Com o bronze do Mundial, Gabriela é recebida pelos pais Lúcia e André em Porto Alegre
Com o bronze do Mundial, Gabriela é recebida pelos pais, Lúcia e André, no desembarque em Porto Alegre
Nesta quarta, Gabriela voltou a Porto Alegre, após comemorar seus 16 anos na Croácia, longe da família, com outro presente: o bronze no Mundial cadete (até 17 anos).
A conquista ocorreu no dia 7, na última semana da garota com 15 anos. A arma usada, o florete. Esse é o segundo maior feito já alcançado por um brasileiro na esgrima.
Em 2003, no sabre, Élora Pattaro ganhou a prata na mesma competição, aos 17.
"Foi uma grande surpresa. No Brasil não há grande tradição, investimento e prestígio para a esgrima, e havia adversárias muito fortes", afirma Gabriela à Folha.
A gaúcha viajou para o campeonato com passagens pagas por seu clube, o Grêmio Náutico União, e a estada bancada pelos pais, Lúcia e André, respectivamente neurologista e ginecologista.
O dinheiro para competir também saiu das economias de Gabriela, que recebe bolsa-atleta do governo --R$ 925 mensais que vão dobrar de valor esse ano em razão dos resultados internacionais.
"Espero que, com a minha conquista, tenhamos mais mídia para a esgrima, estimulando novas gerações", diz. "É importante que empresas e o governo se interessem em investir. A modalidade tem potencial de trazer grandes resultados", completa.

Isto é Gabriela Cecchini

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André Antunes/Divulgação
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Gabriela Cecchini posa para foto do Grêmio Náutico União
Para ir ao pódio no Mundial, a atleta teve de emprestar o agasalho da esgrimista Silvia Rothfeld, pois atletas das seleções cadete e juvenil não têm uniformes próprios.
Segundo Alexandre Teixeira, técnico de Gabriela desde os oito anos, o resultado a coloca com grandes possibilidades de disputar os Jogos do Rio-2016. Mas o plano deles é chegar à Olimpíada de 2020 com chances de medalha.
"Não queremos apressar nada. Ela vai jogar até os 17 anos no cadete, até os 20 no juvenil, e cada aprendizado precisa ser bem sedimentado. Ela tem um ótimo ambiente familiar e todo acompanhamento psicológico feito pelo clube", diz Teixeira.
O amadurecimento também é destacado pela mãe.
"Trabalho com adolescentes, sei que ela é muito diferente. Nasceu adulta. Quando bebê, ela não chorava, nos chamava. Quando criança, já argumentava. Agora, já gosta de boa gastronomia, livros, viagens", afirma Lúcia.
Concentrada, excelente aluna, fã de rock e literatura, a mais velha de três irmãos viaja para competir desde os dez anos e é ligada a questões sociais. No segundo ano do ensino médio, ainda não sabe o que cursar na faculdade. Hoje, quer ser esgrimista.
"Tirando o fato de jogar esgrima e de usar a mesma mochila há oito anos, não me considero diferente de outras meninas de 15 anos", afirma.
Atualmente, ela já é a terceira do ranking nacional adulto, o que deve lhe render a ida ao Pan da modalidade, em junho, na Colômbia, com as despesas pagas pela confederação brasileira, que, hoje, a ajuda com material esportivo e plano de saúde, dado pelo Comitê Olímpico Brasileiro.
"Dá para ver que ela é muito talentosa. Só que talentos precisam de investimento, o que na minha época não existia. Espero que o Brasil aproveite o potencial que ela mostrou", diz Élora, 27, ao ver, dez anos depois, outra brasileira ser medalhista em Mundial.
"Pretendo não me deixar abalar pelos problemas que pequenos esportes enfrentam no Brasil. Espero me manter motivada", diz Gabriela.