segunda-feira, 4 de abril de 2011

As nossas pequenas "Escola Base" de cada dia

“Kombi era motel na escolinha do sexo” gritava a manchete do jornal popular. Os jornalões não ficaram muito atrás. Afirmavam com todas as letras e sentenciavam os envolvidos no caso como culpados. Corria o ano de 1994, que iria ficar marcado para sempre no do jornalismo brasileiro. Pela porta dos fundos. Uma história que ficou conhecida como o “Caso da Escola Base”. Em linhas gerais, foi assim: os donos de uma escolinha em São Paulo acusados de atos de pedofilia com alunos. O linchamento era diário. Acusações e apurações que jamais se confirmaram eram o tempero desse linchamento que passou para o literal apedrejamento da escola e da casa dos diretores. Reputações foram destruídas. Terminado o inquérito, nada foi provado. Era tarde. A destruição de reputações já estava consumada.

Nunca mais houve um caso de tamanho descalabro em nossa imprensa. Que de certa forma, por linhas tortas, tomou uma inesquecível lição. Em nome do rigor e da ética. No entanto, pequenas “Escolas Base” se repetem todos os dias. Muito menores, mas que multiplicam o poder de destruição pela repetição diária.

Poderia desfilar um monte dessas pequenas Escolas Base. Mas por hora o que me interessa e me chama atenção é mais uma vez o Caso Adriano. Alguns dirão que é um exagero a comparação. Claro que é. Ainda bem, seria uma aberração de novo vivermos uma “Escola Base”. Outros dirão que Adriano colabora muitas vezes com postura pouco profissional para que falem dele. Verdade. Mas não estou falando sobre isso. Estou falando sobre “Pequenas Escolas Base”, coisas ditas e repetidas sem comprovação. Que depois, se desmentidas ou não comprovadas, pouco faz de diferença. O estrago já está feito.

Aqui não há defesa ou ataque. Lá atrás nesse blog já botei minhas opiniões e tomei partido. Um pouco solitário, mas bem acompanhado, com Eduardo Galeano. Também não é o caso de mais opinião técnica sobre valer a pena ou não ter o jogador hoje em dia. Aqui se quer apenas discutir nossas pequenas escolas base de cada dia. Sei que muitas vezes na internet é preciso desenhar no lugar de escrever para tentar se fazer entender. Sorte que, sabe-se lá a razão, essa trincheirinha tem sido lugar muito especial quanto ao nível da discussão, mesmo na discordância.

TALVEZ PARA ALGUNS SEJA DIFÍCIL ENTENDER QUE JÁ NÃO ESTÁ MAIS EM QUESTÃO ADRIANO, QUE NÃO ESTAMOS FALANDO DE NOVO EM ADRIANO. ESTAMOS FALANDO DE COISAS MUITO MAIORES. DE NOSSA IMPRENSA, DE NOSSA SOCIEDADE...

Pois um jornal do Rio tinha hoje uma capa escandalosa sobre “novas gravações da polícia sobre Adriano”. (No dia em que ele se apresentou ao Corinthians...)Vamos tentar entender, deixa ver se entendi...Quer dizer que a polícia, paga com o meu e o seu dinheiro, investiga e grava o jogador e sua família há anos...(tem pouco trabalho e coisas pra fazer certamente, estamos na Suécia, afinal). Delegados chamam o jogador para depor. Promotores convocam ele para depor. E anos depois dessas gravações, o que temos é ele contando que passou por uma blitz sem documentos do carro?

Que diabos de estado democrático é esse? Que lei é essa, para quem? Um cara é investigado, grampeado e gravado durante anos. Não constatado o crime, para não perder o serviço e a possibilidade de aparecer, promove-se o vazamento de coisas da vida privada, festas, ou ainda anos de trabalho pra descobrir que ele passou por uma blitz sem documento? Será que não é para ficar indignado nesse país da roubalheira, do Maracanã custando um bilhão, o Pan insepulto em suas contas, Olimpíadas vindo aí, o dinheiro comendo solto na Copa, e um imenso número de bravos policiais durante dois anos dedicados a gravar um sujeito para vazar que ele bebeu ou que furou uma blitz?

Pelo amor de deus, repito, não estou mais falando de Adriano, é Brasil, somos nós, nossa imprensa e nossa sociedade? Que diabos estamos fazendo? É legal isso, ficar gravando sob a couraça de investigação de tráfico e chegar-se a essas conclusões? (como já conheço a cantilena, sei que vão falar da tal foto com fuzil, aquela que o Fantástico ia dar mas recuou porque descobriu que era um abajur. De péssimo gosto, é fato, mas é possível chamar alguém de marginal porque tem um abajur de péssimo gosto?).

No caso de Adriano, o estrago já está feito. Apareçam ou não as tais cabeludas provas de que é bandido, marginal, o veredito já está dado.
É possível chamar alguém de dependente químico sem prova? Se ele é ou não não sei. Mas se não tenho provas, como posso fazer? Adoraria tornar público o que escuto sobre um conhecido político, governador, falar em dependência. Mas não tenho provas. Com Adriano vale. E não querem que eu fale de preconceito, racismo, no ódio que um negro favelado andando com louras desperta...Perguntem ao Paulo César Caju...Anos depois, quando o ódio e o preconceito somam para destruir alguém, vem os vencedores de sempre e sentenciam: “não disse”.

Que imprensa é essa que estamos fazendo? Capa de um jornal para divulgar o fruto de gravações com tal conteúdo? Será que a matéria não era outra? Por exemplo: que polícia é essa e que estado é esse que fica anos usando o dinheiro do contribuinte para isso, anos de investigação e é esse o resultado? E a roubalheira do Pan, do Maracanã? Matérias nos mais variados órgãos reproduzindo o nada...O estrago já está feito. É essa escola que bebeu na fonte do jornalismo-manja que forma tantas opiniões. Quem não lembra da vida exposta de um jogador, citado como namorado de um cantor? Não interessa a ninguém, mas foi dito, citado e ficou por isso mesmo...

Vamos para nossa segunda geração de manjas por estas terras de São Sebastião. É pra isso que tantos derramaram sangue heróico e lutaram pela liberdade? A ala dos jornalistas na passeata dos Cem Mil ainda é uma foto na minha parede. Que o Criador ilumine aquela foto, que aquelas pessoas iluminem o futuro. Estamos precisando.

Ps- tenho visto por aí uma fúria questionadora, com direito a comentários negativos sobre os jogadores que foram à Chechênia. Todos procedentes. Foi um absurdo o tal jogo. Só senti falta de muitos que agora condenam terem feito o mesmo quando a CBF levou o Brasil para jogar no Zimbábue e em tantos outros lugares. Ainda aguardo a mesma coragem.