domingo, 9 de agosto de 2015

Atual campeão da MLS, brasileiro quase levou Beckham para o Corinthians

MLS
Campeão pelo Galaxy, Marcelo Sarvas hoje joga no Colorado Rapids
Campeão pelo Galaxy, Marcelo Sarvas hoje joga no Colorado Rapids
Ninguém discute a importância de David Beckham para a MLS. O inglês, que chegou em 2007, revolucionou a liga quando atuou pelo Los Angeles Galaxy.
A fama é tanta, que a regra dos designated players, jogadores especiais que ultrapassam o teto salarial estipulado pela liga, tem o apelido de David Beckham Rule, uma vez que foi para trazer o meia que a Major League Soccer quebrou sua política financeira.
Imagine então o peso que um jogador carrega ao ser indicado pelo craque britânico para atuar nos Estados Unidos.
O meia brasileiro Marcelo Sarvas, do Colorado Rapids, sabe bem disso.
Ele atuava no Alajaulense (Costa Rica) quando enfrentou o Galaxy pela Concacaf Champions League de 2011. Mesmo com a derrota por 1 a 0, sua atuação chamou a atenção de Beckham. Poucos dias depois, seu telefone tocou. O prefixo do telefone já indicava. A ligação era de Los Angeles.
"Eles entraram em contato comigo para me contratar e eu aceitei. E o curioso é que no dia da minha apresentação, o Beckham deu uma coletiva porque tinha acabado de renovar o seu contrato. Quando acabou, me levaram para o camarim dele. Ele me reconheceu, me elogiou e me disse que ele tinha recomendado minha contratação. Fiquei muito feliz", contou Sarvas, em entrevista ao MLS Inside.
A convivência com David Beckham no LA Galaxy foi a melhor possível. O brasileiro ficou impressionado com o profissionalismo do astro inglês e sua dedicação nas atividades, que ia na direção oposta das fofocas sobre a vida de popstar e aquele glamour todo. "Ele puxava a fila nos treinos", conta Sarvas, que viu a afinidade com o meia aflorar por causa do Brasil. Beckham gostava muito de duas coisas tipicamente nossas.
"Ele falava sempre dos churrascos que faziam na casa do Ronaldo e do Roberto Carlos em Madrid. E gostava muito de Guaraná, ele tomava direto! Não é fácil de achar em Los Angeles. Mas ele ia, comprava, bebia no vestiário sempre e deixava toda vez um engradado para os 3 brasileiros do time, Leonardo, Juninho e eu".
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Marcelo Sarvas comemora gol do Los Angeles Galaxy com David Beckham em 2012
Marcelo Sarvas comemora gol do Los Angeles Galaxy com David Beckham em 2012
Além de compartilhar do mesmo vestiário, Marcelo e Beckham também dividiam o setor do time. O meio-campo com eles se fortaleceu muito e ao lado de Juninho (que ainda está no Galaxy), levaram o título da MLS em 2012. Após essa conquista, o brasileiro aproveitou a amizade que tinha com o craque e fez um convite inusitado. Porque não jogar no Brasil? Ronaldo já tinha voltado e foi um sucesso. Ronaldinho Gaúcho e até Seedorf também estavam lá e arrebentando. Porque não Beckham?
"Perguntei se ele gostaria, ele disse que sim e até comentou que uma vez teve contato com o Palmeiras mas não saiu nada", contou Sarvas, que então falou do seu time do coração, aquele onde tinha mais abertura e conhecia mais gente.
"Aí falei do Corinthians, já que fiz a base toda lá e joguei com o Edu (Gaspar, gerente de futebol), conheço ele. O Beckham sabia que o Ronaldo tinha jogado lá, sabia da grandeza do Corinthians. E então comecei a mover os meus pauzinhos. Não consegui falar com o Edu, mas falei com o Ilmar (Schiavenato, ex-diretor Social e parente de Marcelo) que me pos em contato com o Mario Gobbi e o Luiz Paulo Rosemberg. Trocamos emails, eles acharam a ideia legal, e o Beckham autorizou que eu passasse o contato do empresário dele para o Corinthians. Chegaram a conversar sobre números, mas parece que a proposta não foi suficiente. Infelizmente não deu certo, seria fantástico para o futebol brasileiro", revelou o brasileiro.
Marcelo Sarvas tentou realizar com Beckham um sonho que ele mesmo não conseguiu concretizar. Ele fez a base toda no Timão mas não jogou no time profissional, e isso o deixa um pouco frustrado. Atuou em uma geração brilhante do clube paulista, que revelou nomes como Fernando Baiano, Ewerthon, Edu Gapar, Gil e Kléber. O bom momento vivido pelo time profissional, com Marcelinho, Ricardinho, Vampeta e Rincón, dificultava que todos os garotos subissem e tivessem sua chance. Mas foi a entrada definitiva dos empresários que complicou tudo e driblar o sistema tornou-se um obstáculo intransponível para o bom meia do Colorado Rapids.
"Eu via jogadores chegarem todos os dias e já jogavam. Não dependia só de mim. Eu não tinha empresário, fui titular em todos os anos da base, mas não subi. Talvez se eu tivesse tirado as coisas das mãos do meu pai e colocado tudo pra um agente, eu teria chegado. Não escondo de ninguém que gostaria de ter jogado como profissional no Brasil. Gostaria de ter passado mais tempo perto da minha família e criado meus filhos perto dos meus pais", desabafou o jogador.
Como isso não foi possível, Marcelo buscou seu sucesso profissional em centros menos difundidos. Jogou na Suécia, Polônia e Costa Rica até desembarcar em Los Angeles. No Galaxy foram dois títulos em três anos com titularidade absoluta. Mas depois da conquista do ano passado, onde foi um dos melhores do campeonato, se sentiu pouco valorizado e decidiu sair.
"Esperava mais do clube. Sempre usam o teto salarial como desculpa, mas vivem contratando jogadores de expressão. Havia feito muito por eles, mas veio o desafio do Colorado, que me preencheu essa parte financeira", contou.
A troca, tecnicamente, foi dura para Sarvas. Ele deixou o atual campeão para jogar no lanterna da conferência. O Rapids tem apenas cinco vitórias em 21 jogos e dificilmente irá aos playoffs. A realidade diferente mexe com o senso competitivo do brasileiro. Mas também liga o alerta do jogador para um lado da MLS que poucos destacam. Conhecida e elogiada como uma liga que preza pelo equilibrio entre suas equipes, nivelando tecnicamente e aumentando o grau de disputa, Marcelo atenta para um processo de segregação financeira que pode afetar o futebol do país nos próximos anos.
"Eles sempre controlaram o orçamento do clubes. Mas agora tem alguns donos de franquia, como no Galaxy, Vancouver, Montreal, Toronto e Nova York, que estão investindo mais, colocando mais dinheiro para contratar jogadores de nome. Isso vai acabar criando o clube grande, médio e pequeno aqui, coisa que não tinha antes. A diferença entre os clubes está ficando cada vez maior. Sei que hoje jogo em um clube pequeno", analisou o brasileiro, que acredita que na próxima década a MLS já estará à frente de campeonatos como o Português e até o Italiano.
Aos 33 anos, Marcelo Sarvas tem mais dois de contrato com o Rapids. Já decidiu que ficará por lá mesmo depois que pendurar as chuteiras. Está tirando licença para treinador e quer assumir as categorias de base do clube. Vai permanecer no país que o possibilitou realizar seus objetivos no futebol, com gols, títulos e grandes atuações. As montanhas e a tranquilidade do Colorado conquistaram o brasileiro, que só trocaria isso tudo por uma coisa. Um novo telefonema.
"O Beckham está montando um time em Miami né? Talvez eles entrem na MLS em breve. Ah, quem sabe eu não me encaixo no projeto e assumo um cargo lá?", finalizou.