segunda-feira, 21 de julho de 2014

O discurso da inpotência venceu

Eis o resultado do pensamento pequeno. Demorou, mas o trabalho parece concluído. Opinião pública, torcida e, a julgar pela postura em campo, até jogadores já estão convencidos de que o Flamengo atual é uma instituição com aspirações menores, destinada ao papel de coadjuvante. E, sendo assim, perder um jogo após outro é normal.

No Beira-Rio, a exibição pálida, conformada, passiva deste Flamengo que já lida com uma fartura de limitações em seu elenco, foi reveladora. É o retrato de um clube. O discurso da terra arrasada realmente parecia conveniente a quem se propunha gerir o clube. Afinal, valorizaria qualquer tímido avanço. Na lógica do quanto pior, melhor. Dívida inflada e depois corrigida num passe de mágica, investimentos modestíssimos, tudo à feição. Só que, repetido à exaustão, o discurso agora cobra seu preço. O Flamengo se apequenou de vez. Levou o personagem pra cama. Pode acabar sendo fatal.

Hoje, o discurso soa tão frágil quanto o time que tem entrado em campo. Basta olhar os números e toda a realidade do clube soa injustificável. Sejamos coerentes. Quantas vezes a opinião pública cobrou o cumprimento de compromissos e a redução dos absurdos débitos dos clubes? Mas o Flamengo de hoje, conforme denuncia seu balanço, diminuiu muito menos do que o prometido a sua dívida. O elenco frágil, em tese explicado pela falta de dinheiro, é dos mais caros do Brasil. Ou seja, gasta-se muito com o time atual. Para completar, o planejamento financeiro, estrela da atual gestão, conduziu à repetição do filme dos atrasos nos salários.

É justa e elogiável a preocupação de não endividar o clube ainda mais. Aliás, deveria ser obrigação, embora no Brasil ainda soe como exceção. Mas os valores que giram anualmente no futebol do Flamengo não combinam tanto com a palavra austeridade. Quando avaliados tendo como parâmetro a qualidade do futebol que é jogado, combinam mesmo com a palavra equívoco.

Mas a naturalidade com que foi construída a goleada no Beira-Rio revela que, mais grave do que os erros na montagem do elenco, é a filosofia que reina no clube. Quando viajou a Porto Alegre, o Flamengo o fez como se dirigisse a um ritual sumário e inevitável de sacrifício, de execução. O discurso da impotência venceu.

O estrago está feito. É lógico que há sinais claros de acomodação em campo, é notório que Ney Franco carece tanto de peças quanto de convicções mesmo após 40 dias de treino. Mas o Flamengo de hoje não convida seus profissionais a ousar, a pensar grande. Convida todos a aceitarem as derrotas como banalidade. Como se a herança justificasse todas as limitações, mesmo aquelas que vêm de quem prometeu ser revolucionário na gestão. As promessas de um mundo novo tornam justas as expectativas de, ao menos, um pouquinho mais de ousadia e soluções criativas. Normal esperar mais de quem promete ser diferente.

Mergulhar na crise ainda no início do campeonato costuma oferecer mais chances de salvação aos clubes grandes. E o Flamengo pode se salvar. Afinal, se o objetivo que hoje soa mais realista é a simples permanência na Série A, a concorrência não é das mais brilhantes. Mas para vencê-la, o primeiro passo é romper com o pensamento tacanho.