terça-feira, 23 de abril de 2013

Os absurdos do Maracanã e seu leal defensor

Chama-se Regis Fichtner. Nos tempos do Febeapá, a flor dos Ponte Pretas não o perdoaria. Hoje, como secretário de estado da Casa Civil do Rio de Janeiro, tem carta branca para falar e escrever o que não deve. Ou melhor, deve, sim, ao governo que ele representa e a cujos absurdos tem a missão de defender com argumentos quase sempre indefensáveis.

Falando, o secretário firma posição a respeito das cadeiras perpétuas do Maracanã. Escrevendo, faz o mesmo quanto à reforma do estádio e a licitação que o entregará ao empresário amigo do governador. Não é hora de discutir se a atitude do governo, nos dois casos, é certa ou erada. Se a questão das cadeiras ainda está aberta, ou semiaberta, a do estádio, reforma e licitação, já são favas contadas. O que pretendemos, nessas linhas, é comentar as argumentações do secretário. Pouco importa se sinceras ou se formuladas apenas para agradar o patrão, verdadeiro responsável por tudo que ocorre no Maracanã.

Sobre as cadeiras perpétuas, ao dizer que quem as comprou não tem direito a elas o secretário defende que o estado tem poderes para tirar de qualquer cidadão aquilo que ele adquiriu legalmente. Tem mesmo, governador? A bobagem mais contundente está em outra fala, segundo a qual quem adquiriu as cadeiras para assistir à Copa do Mundo de 1950 não tem o direito de assistir de graça a "todas as Copas do Mundo". É mesmo, secretário? E quem disse que quem comprou as cativas (válidas por cinco anos) e perpétuas (o nome diz tudo) o fez só para assistir àquela Copa? Passou pela cabeça de algum deles – ou de alguém mais – que, 64 anos depois, haveria outra Copa do Mundo no Brasil? Os donos das cadeiras mereciam do governador e seu porta-voz ao menos o respeito a quem gastou uma pequena fortuna, entre 1948 e 1950, não só para ver a Copa, mas para ajudar a construir o estádio. Em vez de mandá-los para a Justiça, deveriam fazer como o governador da época (na verdade, um dos prefeitos do Distrito Federal) que lhe prometeu perpétua gratidão. As coisas eram bem mais direitas naquela época.

As razões da reforma e da licitação estão num artigo publicado em jornal carioca. Que já começa mal: "Assim que o Brasil foi escolhido sede da Copa de 2014, o governo do estado constatou que o Maracanã de 1950 não cumpria mais os requisitos atuais para a Copa do Mundo". Não é verdade. Quem o constatou foi a Fifa, que sintomaticamente não é sequer citada no artigo. Aliás, é a poderosa Fifa, a falsa ONU do futebol, a verdadeira dona desta e de todas as Copas. No Brasil, todos a obedecem de modo serviçal. Mudam-se leis, rompem-se tradições, permite-se que torcedores sejam lesados na compra de ingressos para a Copa das Confederações, baixa-se a cabeça quando seu secretário-geral nos ameaça com um pontapé no traseiro. Mas terá sido a Fifa a única vilã da história? Ou ela simplesmente abriu caminho para que nossos dirigentes, políticos e esportivos, gastassem uma fábula para reformar o Maracanã e depois o entregassem, prontinho, "seguro e confortável" ao amigo do governador? Se der pé, sem cadeiras perpétuas.

No tal artigo, confessando a incompetência do estado para gerir o novo Maracanã, já que sua missão principal é "prover serviços públicos essenciais, como educação, saúde e segurança" (quase não resistimos a perguntar como vão esses três itens no Rio de Janeiro do atual governo...), o secretário justifica que o ex-maior estádio do mundo passe a outras mãos. Repetindo, prontinho "seguro e confortável". 

Vale ler o artigo por inteiro, assim como acompanhar futuras possíveis falas do secretário sobre as cadeiras perpétuas. Quando ele diz que, a partir de agora, o Maracanã pertence à dona da Copa do Mundo (que não é o Brasil, mas a Fifa), pode estar agradando ao patrão, ou se livrando do pontapé no traseiro do arrogante secretário-geral, mas certamente, nos tempos de Stanislaw, seria sério candidato a cocoroca do ano