quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Carta a um jovem amigo palmeirense

Matheus, 

A gente ainda não se conhece, mas é questão de tempo. Seu pai é um dos bons amigos que fiz nesse mundo moderno, onde a gente não se encontra muito com os amigos, mas sabe do que eles gostam, sabe pelo que eles sofrem, sabe qual o prato preferido de gente que a gente preferia ver mais vezes. 

A gente ainda não se conhece, mas eu sei que você está numa fase complicada, rapaz. No domingo, seu pai me contou que teve uma conversa séria com você, explicando que os próximos dias, talvez meses ou anos, seriam difíceis. Ele não te deu alternativas, né?, e você acabou se tornando um palmeirense; ou um palestrino, como dizem os antigos. Mas seu pai não é tão antigo assim.

Os próximos dias serão difíceis, mesmo, Matheus. Mas serão importantes. Você ainda não sabe disso, mas o futebol é uma coisa que, para gente como eu, seu pai e você, vai muito além daquele jogo de quarta, domingo, do treino e da crise que derruba um técnico e faz gente chorar, sorrir, enfartar e pichar muros. Pichar muro é errado, hein, não caia nessa.

Para gente como eu, seu pai e você, o futebol é uma escola. Eu não nasci aqui em São Paulo, nasci numa cidade chamada Goiânia, um dia a gente pode ir passear por lá. E eu resolvi que torceria por um time da minha cidade, que é uma cidade bonita, de gente boa, trabalhadora. Mas que talvez nunca terá um time campeão brasileiro. Da Série A, porque da B a gente consegue se virar de vez em quando.

Mas eu não vou falar de Série B com você agora, no quinto parágrafo desta carta que você só vai ler daqui a uns cinco anos e só vai entender direitinho, palavra por palavra, uns anos depois, quando estiver na escola, aprendendo as letras, números e sonhos que nos fazem crescer e conhecer mais na infância do que em qualquer outra época da vida. E na infância, a gente acha que essa escola onde a gente aprende matemática, português e ciências é a única. Mas eu vou te avisar uma coisa: não é.

O futebol também é uma escola, Matheus, e seu pai sabe bem disso; não conte a ele que eu te disse, mas ele está te ensinando uma série de lições desde que você nasceu. No futebol, existem dois lados: os dos que vencem e o dos que aprendem a viver. Quem vence faz festa, comemora, grita, vibra, enche o saco do colega de trabalho no dia seguinte, sente-se o herói do mundo por uma, duas, três semanas. Tem gente que é mais chato e sente-se o herói por toda a eternidade, mas você vai saber se afastar desse tipo de gente.

Quem perde, sofre. Claro que sofre. Seu pai me contou que, no fim do jogo do Palmeiras com o Fluminense, no domingo, ele ficou abraçado com você, de pé, na sala de casa. Ele me disse que queria estar junto com você, é claro que ele tinha de fazer isso, ele é seu pai e precisa te proteger. Mas ele não vai conseguir te proteger sempre, e isso também é bom. 

Talvez, quando você for para a escola, daqui a uns dois ou três anos, o Palmeiras já tenha voltado para a Série A e ganhado títulos, o Palmeiras é grande, é imponente, é um monte de outras palavras que você vai aprender a colocar antes ou depois do nome do seu time, naquele caderno de Geografia, durante as aula de relevos, tipos de clima e vegetação.

Mas o mais importante, Matheus, é que, qualquer que seja a divisão em que seu time jogar, qualquer que seja o resultado do jogo, você estará bem - seja comemorando as vitórias, seja aprendendo com as derrotas. Só que, na hora das derrotas, você nunca vai perceber isso; você só vai perceber quando seu time vencer de novo, quando você notar o quanto valeu a pena cada lágrima de choro, cada piada que você vai ouvir, cada falha daquele jogador que seu pai vai xingar mil vezes - e, por favor, aprenda os palavrões com seu pai, é mais legal que aprender na rua.

Os próximos dias serão difíceis, Matheus. Desde que você nasceu, há pouco mais de dois meses, os dias para seu time têm sido difíceis. O Palmeiras deve cair para a Série B, mas não é o fim do mundo. É como se fosse assim: imagina que você fez muita bagunça, daí seu pai te colocou de castigo. Você fica no castigo, para de fazer bagunça e depois volta, sabendo que não vai poder bagunçar de novo. 

Se você for esperto, vai saber fazer suas bagunças de um jeito diferente, vai ser feliz e continuar aprontando de vez em quando. Um castigo bem dado vale muito mais que um presente caro.

Mas isso, você não precisa entender agora.