quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Um incêndio e muitas dúvidas

Na madrugada do dia 20 de setembro, no elegante bairro de Grünwald, em Munique, uma bela casa ardia em chamas e foi completamente destruída, restando apenas as paredes de alvenaria. Era a casa do jogador brasileiro Breno, contratado pelo Bayern Munique a peso de ouro em janeiro de 2008, quando o zagueiro tinha 18 anos de idade.

Vestindo apenas um calção, Breno conseguiu escapar do fogo que se alastrava rapidamente pela casa e foi para a rua chamando por socorro. Teve apenas algumas escoriações e, por ter inalado muita fumaça, apresentava sinais de intoxicação. Foi socorrido pelos para-médicos do resgate, aos quais, de acordo com relatos de testemunhas e do jornal "Sueddeutsche Zeitung", teria entregue três isqueiros. Sua esposa e seus filhos não se encontravam na residência.

Breno foi levado a um hospital para permanecer em observação e, de acordo com o diretor de esportes do Bayern, Christian Nerlinger, "estava em estado de choque, mas já em fase de recuperação."

No dia seguinte, investigadores da polícia, técnicos especialistas e um cão farejador iniciaram a busca por indícios que pudessem levar à uma conclusão sobre a origem do incêndio. No mesmo dia, o proprietário da casa manifestava sua surpresa pelo fato do fogo ter consumido com tanta rapidez a casa inteira, visto que o imóvel tinha sido totalmente reformado há apenas um ano. Havia um seguro contra incêndio, mas que não seria pago se ficasse comprovada a responsabilidade, intencional ou não, do inquilino ou do proprietário, no sinistro.

Na sexta-feira, 23 de setembro, a reviravolta do caso: de testemunha, Breno passou a ser o principal suspeito. O procurador T.S. Koch afirmava: "...há fortes indícios de que houve uma ação intencional no sentido de provocar o incêndio", justificando desta forma o indiciamento do jogador brasileiro e acrescentava: "...vamos confrontar Breno com fatos novos para que ele possa se defender e dar a sua versão." De acordo com o código penal alemão, a pena mínima para o crime de incêndio intencional é de um ano de prisão.

A diretoria do Bayern de Munique reagiu com surpresa ao indiciamento do atleta e lhe sugeriu um imediato tratamento psicológico com eventual internação no famoso Instituto Max Planck de Psiquiatria, em Munique.

No dia seguinte, sábado, 24 de setembro, sob a alegação de que havia a possibilidade de Breno fugir do país e/ou ocultar provas, a juíza de instrução do caso aceitou os argumentos da procuradoria de Munique e expediu um mandado de prisão contra o jogador que foi detido no mesmo dia e levado para a Penitenciária de Munique, onde permanece na enfermaria do estabelecimento prisional sob cuidados médicos.

Logo após a detenção de Breno, a diretoria do Bayern de Munique manifestava a sua indignação. Uli Honess, presidente do clube, afirmava:"A prisão de Breno é inadmissível. É algo que jamais achei ser possível acontecer no nosso país. Sabemos que nem tudo está esclarecido, mas o teatro que a procuradoria de Munique faz em torno desse caso é uma loucura. Estamos atônitos com a ação da polícia. Breno deveria estar num hospital e não numa prisão". Karl-Heinz Rummenige, diretor executivo do Bayern, declarou ao jornal Merkur de Munique: "Vamos apoiar Breno nessa situação. É preciso ressaltar que, de acordo com a lei alemã, vale a presunção de inocência enquanto não houver prova em contrário."

Ninguém sabe ao certo o que aconteceu de fato naquela noite fatídica na casa de Breno, a não ser ele mesmo. Por enquanto, de acordo com a polícia, há apenas indícios. O próprio encarregado do inquérito, o procurador T.S. Koch, declarou numa de suas inúmeras entrevistas: "Breno terá a oportunidade de esclarecer tudo."

Isto posto, é preciso deixar claro que num Estado de Direito qualquer suspeito de uma ação criminosa é considerado inocente até prova em contrário. Não é diferente na Alemanha e a Justiça daquele país tem a obrigação de garantir a integridade física e psíquica de Breno, assegurar-lhe pleno e amplo direito de defesa na presença de um advogado, além de zelar pela manutenção de sua dignidade como ser humano enquanto estiver no estabelecimento prisional.

O Bayern de Munique, empregador de Breno, manifestou verbalmente apoio ao jogador através dos membros de sua diretoria. Está na hora de transformar palavras ditas na imprensa em ações concretas de apoio. O clube, convicto da inocência do seu atleta, não deve medir esforços para obter sua libertação provisória mediante pagamento de fiança para que Breno possa aguardar em liberdade as ações do poder judiciário enquanto não for determinada definitivamente a sua responsabilidade no incêndio. Além disso, o clube tem a obrigação de zelar pela saúde do seu jogador, seja através do seu próprio departamento médico, seja através da rede hospitalar de Munique.

Breno saiu muito jovem do Brasil para uma terra estranha e de cultura completamente diferente. Foi jogar no maior clube da Alemanha, onde a concorrência é brutal e não conseguiu se firmar como titular na equipe. No decorrer do percurso, sofreu com contusões das quais não se recuperou completamente até hoje, além de passar por problemas de ordem estritamente pessoal. Sabe-se agora que vivia bastante isolado em sua bela casa num bairro elegante de Munique. Mal falava alemão e tinha muitas dificuldades de se integrar à uma sociedade refratária a novos relacionamentos. Comparecia ao Centro de Treinamento do Clube apenas para tratar de sua reabilitação física fazendo fisioterapia. Queixava-se de dores no joelho e temia por uma nova intervenção cirúrgica. O seu grande sonho de uma promissora carreira no futebol internacional foi consumido pelo fogo e acabou virando um grande pesadelo na madrugada de 20 de setembro.