terça-feira, 7 de abril de 2015

Muricy Ramalho vai cuidar da saúde - que volte melhor, atualizado...e menos blindado

GAZETA PRESS
Muricy ramalho durante treino no São Paulo nesta sexta-feira
Muricy Ramalho deixa o São Paulo para cuidar da saúde.
Enfim, acabou o impasse. Muricy Ramalho vai para casa tratar a diverticulite e o São Paulo procurar um novo treinador para cuidar do seu time.
O técnico que parecia cansado e sem ânimo está certo. Sem saúde perfeita não há como cuidar da tarefa multidisciplinar que é a gestão de um elenco. Muito menos no ambiente político conturbado do clube.
Mas a responsabilidade pelo mau futebol da equipe também era do comandante. Setores descoordenados, jogadores subaproveitados, muitas vezes mal escalados - como na derrota para o Corinthians na estreia da Libertadores.
O corpo debilitado era lembrado nos reveses. Nas vitórias, até as velhas tiradas de seu humor ranzinza apareciam, assim como os elogios.
Muricy merece respeito e até admiração como profissional vencedor e vivido. Mas não precisa de blindagem.
Em mais de trinta anos acompanhando futebol obsessivamente, como ofício ou não, este que escreve nunca viu um técnico tão protegido e isento de criticas. Nem Telê Santana, mitificado hoje com alguma justiça, porém execrado em 1986 pela derrota da seleção brasileira de Júnior, Sócrates e Careca. Mas também do inexplicável Elzo, volante que não errava passes - porque só tocava de lado.
Detonado e mantido por um fio no final de 1990 no próprio São Paulo, depois da derrota na final do Brasileiro para o Corinthians. Numa equipe mais qualificada que a rival, mas que, a rigor, só tinha uma jogada ofensiva: lançamentos para o veloz, e pouco mais que isto, Mário Tilico.
Apanhou, cresceu, aprendeu e acrescentou novos conceitos à sua filosofia, como meio-campo marcador liberando as jogadas pelos flancos. Com ataque investindo na técnica, sem centroavantes toscos como Nei e Eliel, ganhou tudo e fez história no tricolor paulista.
Muricy não teve essa chance até aqui, em clube algum nos últimos anos. Porque quando vence os méritos são do treinador. Como após a conquista da Libertadores no Santos em 2011, na entrevista logo depois da vitória na final, ainda no campo, quando disse que ele merecia aquele título porque "melhora os caras" e contou com a cumplicidade costumeira.
Nas derrotas, a culpa é de todo o resto. Elenco fraco, jovens da base com "defeito de fábrica", falta de sorte, apatia do time ou superioridade absoluta do adversário - como nos 4 a 0 para o Barcelona de Guardiola, quando "ajudou" armando o time santista num 5-3-2 nunca utilizado antes e escancarou o meio-campo para Busquets, Xavi, Iniesta, Fábregas e Messi.
Em 2015, perdeu Kaká, referência de experiência e liderança, mas ganhou os reforços pedidos. Inclusive a velocidade e o drible de Centurión. Faltou futebol, trabalho coletivo.
Porque Muricy é da escola de treinadores brasileiros que acreditam que basta arrumar o sistema defensivo e deixar o talento e o instinto resolverem na frente. Ainda que Guardiola, Mourinho, Ancelotti, Klopp, Simeone e outros técnicos que comandam verdadeiras seleções internacionais ensaiem situações de jogo no ataque.
No São Paulo tricampeão brasileiro, faltou o craque e sobrou pragmatismo - bola parada, jogada aérea, contragolpe.
Agora é hora de tratamento, descanso, reflexão. Se possível, uma reciclagem. Com humildade para aprender e se atualizar, como quando inseriu a posse de bola em seu repertório depois da surra em Yokohama há pouco mais de três anos. Sem o discurso "quero ver ganhar o Brasileiro com jogo quarta e domingo, sem milhões pra contratar".
Principalmente sem a blindagem que em nada ajuda e acrescenta. Não conheço Muricy Ramalho. Quem convive exalta o homem íntegro, reto, sério e trabalhador. Não duvido. Mas a crítica construtiva acrescenta, mesmo que o técnico responda inicialmente com uma invertida ou um "sabe nada, nunca chutou uma bola".
É hora de deixar o homem repousar com a família. Que o profissional volte melhor em corpo e mente para contribuir com o crescimento do futebol brasileiro. Quem venceu tanto sempre pode ajudar.