terça-feira, 18 de junho de 2013

A bola que queima pés brasileiros é a que os espanhóis domesticaram. E fazem dela gato e sapato

Encerrada a primeira rodada da Copa das Confederações, algumas conclusões. O time brasileiro trocou 515 passes ante o Japão e os italianos apenas nove a mais contra o México. Mas a distribuição entre os setores foi bem diferente. Luiz Gustavo e Paulinho, os dois volantes, deram, juntos, um total de 102, enquanto a dupla De Rossi-Pirlo somou 142. Os quatro defensores brasileiros (Daniel Alves, David Luiz, Thiago Silva e Marcelo) somaram 265 toques, enquanto o quarteto defensivo da Azzurra (Abate, Barzagli, Chiellini e De Sciglio) totalizou 247.
Fica evidente que os dois meio-campistas mais próximos dos defensores da Itália são mais acionados, participam mais ativamente do início dos lances. Isso faz com que o vice-campeão europeu trabalhe melhor a posse de bola, saia tocando e evite lançamentos longos a todo instante, recurso comum no futebol brasileiro e no time sob a batuta de Luiz Felipe Scolari.
Tanto que 48% da posse de bola do Brasil foi no meio-campo e a Itália alcançou 58% de sua posse nesta faixa do gramado. Isso porque o Brasil ligava diretamente da defesa ao ataque, cabendo a Hulk, Oscar e Neymar segurar a pelota, enquanto os italianos procuravam conduzí-la, tocando. Uma nítida diferença de estilo. Os brasileiros tocam menos, aceleram e esticam mais.
Mas espantoso mesmo é ver o quanto os meio-campistas da Espanha dominam a pelota, a manejam, fazem o que bem entendem com ela durante quase 80% do tempo de jogo. Busquets, Iniesta e Xavi (que não jogou os 90 minutos) deram, cada um, mais de uma centena de passes, com praticamente 97% de acerto. O Uruguai foi mais um a ficar na rodinha de bobo dos campeões mundiais.

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Iniesta contra o Uruguai: dono do jogo e com mais toques na bola sozinho do que os volantes do Brasil
Iniesta contra o Uruguai: dono do jogo e com mais toques na bola sozinho do que os dois volantes do Brasil

Se no Brasil os dois zagueiros aparecem entre os três que mais passes trocaram contra o Japão, diante dos uruguaios a dupla de zaga da Espanha ocupou apenas a sexta e a sétima posições no ranking dos que mais tocaram na pelota. E como observa o companheiro Marcelo Bechler — cliqueaqui para ler ótima análise — "a seleção brasileira teve mais do que o dobro (27% a 13%) de bola na defesa do que os espanhois. A Espanha teve apenas 13% da bola no pé em sua retaguarda. A maior parte esteve no meio-campo, na construção e sobretudo controle do jogo".
Claro que o Brasil está em estágio diferente do poderoso e montadíssimo time espanhol. Mas alguns números escandalizam. Se a dupla de volantes brasileiros trocou 102 passes, sozinhos, Iniesta e Xavi tocaram mais na bola do que Paulinho e Luiz Gustavo. E Xavi (saiu 32 aos minutos do segundo tempo), teve apenas um passe a menos. Conclusão: é abissal a distância do time cebeefiano para quem hoje melhor domina a bola, a controla, e com isso constrói jogadas.
E quando falamos da seleção, a imagino buscando o melhor, a excelência. Isso não está acontecendo hoje. Não que seja obrigatório ver todos os times jogando à espanhola, pelo contrário. Mas seria ótimo observar os brasileiros praticando um futebol competitivo, moderno, técnico, como foi nos melhores tempos. Que isso pelo menos fosse um objetivo. Um exemplo? O Bayer de Jupp Heynckes (três anos mais velho do que Felipão) foi competitivo, moderno, vencedor na temporada.
A bola que queima pés brasileiros e os obriga a despachá-la para longe, para alívio e euforia de alguns, é a mesma que os espanhóis domesticaram. E fazem dela gato e sapato.
Total de passes*
Brasil (x Japão)
Daniel Alves 84 (5)
Thiago Silva 74 (3)
David Luiz 54 (3)
Luiz Gustavo 56 (0)
Marcelo 53 (5)
Oscar 48 (3)
Paulinho 46 (3)
Hulk 36 (6)
Neymar 35 (1)
Itália (x México)
Chiellini 77 (1)
De Rossi 77 (4)
Pirlo 65 (2)
De Sciglio 63 (4)
Barzagli 54 (1)
Abate 53 (3)
Montolivo 54 (3)
Giaccherini 33 (5)
Marchisio 26 (2)
Espanha (x Uruguai)
Busquets 108 (4)
Iniesta 107 (4)
Xavi 101 (4)
Alba 92 (5)
Arbeloa 81 (6)
Piqué 59 (1)
Sérgio Ramos 58 (0)
Fábregas 63 (7)
Pedro 53 (1)
* entre parênteses o número de passes errados
Fonte: Footstats